quarta-feira, 1 de agosto de 2012

178# Texto - 2#


As luzes elevaram-se sobre o público, alegrando os olhos mais atentos. Uma salva de palmas ecoou pela tenta, que era larga e alta. Escura por dentro, riscada por fora em tons de carmim, branco e azul. No centro do palco, com passos ligeiros e um sorriso escondido, saltou um homem envergado de negro. Encostou-se à borda da arena, que era demarcada por uma espécie de cerca, e observou. As crianças de olhos grandes, os gordinhos de narizes pequenos, o aborrecimento de quem não lá queria estar e, finalmente, o brilho nos olhos daqueles que viviam para encarar o circo.
Abandonando a cerca passeou mais uma vez, acenou, fez vénias e parou, por fim. Elevou uma das mãos ao ar, enquanto a outra repousava sobre a barriga, e falou, arrebatando o espaço vazio com o seu timbre juvenil. Embora fosse um homem de avançada idade.
- Senhores e senhoras! Meninos e meninas! Sejam bem-vindos, o espetáculo vai começar. 
Aquela frase já era esperada, muitos a sabiam de cor, outros sorriam e ainda havia quem nem ligasse àquilo. A má vontade comandava as ideias do divertimento. Contudo, ele prosseguiu.
- Trata-se de mais um show de magia, ondas de legria, rios de felicidade - prolongou aquela última palavra propositadamente, mas não esperou pelo efeito. - Caras cobertas de espanto, cortes sem sague e uma plateia gritante! - O seu tom de voz subiu, tal como o calor da sua voz, apressando as palavras ditas. - Saltos de um lado para o outro, cambalhotas e piruetas, bailarinas de todo os tamanhos e palhaços bem patetas. Voos de pombas, chapéus sem fundo, chuvas miudinhas e homens do fim do mundo! Fortes, grandes! Espadaudos, como bárbaros. 
Exaltou-se e as palmas surgiram antes do final do seu discurso. Fitou os rostos, sem qualquer preocupação. O que ele gostava, no fundo, era dos sorrisos das crianças, as vozes esperançadas, livres de ideias falsas, puras por si só. Aquele era o público por que esperava, sem espectativas, sem criticas, apenas com o desejo de rir mais uma vez.
- De todos cantos de um globo sem cantos, para as mais belas criaturas que há no mundo. Sem grandes histórias ou farsas de um mestre, aqui deixo-vos o meu espetáculo e um obrigado profundo.


Sorte nº17, NamelessGirl

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"Posso não concordar com uma só palavra tua, mas defenderei até a morte o teu direito de dizê-lá."__ Voltaire